quinta-feira, 14 de abril de 2016

CARTA AO PROFESSOR CRISTOVAM BUARQUE



          Querido Professor Cristovam Buarque,

Quando da sua candidatura à reeleição em 1998 fiz uma campanha incansável junto aos meus colegas de escola (Estudei no CEM 04 de Ceilândia), junto aos professores e contra um Diretor que na ocasião o constrangi em sua presença por fazer campanha aberta para o Joaquim Roriz e Arruda na Escola!!!
Sim, fiz parte da primeira turma que prestou vestibular através da Avaliação Seriada, implementada na sua gestão, e que, infelizmente, não consegui aprovação, ainda não entendia muito desse negócio de vestibular e avaliação seriada... Comentei com amigos que éramos "preparados" para sermos office boy ou vendedor (era bom de vendas, ao menos era o que diziam meus clientes, pois vendia chocolates e comecei a engraxar sapatos aos 7 anos de idade).
No ano seguinte, levado pelo sonho do meu irmão Edson, o 10° filho do Sr. Chico e Dona Zélia, apaixonado pela História do meu País, conseguimos entrar na Faculdade. Ironicamente nesse período trabalha de Auxiliar de almoxarife no Setor de Indústria da Ceilândia onde no ônibus que eu pegava para o meu trabalho passava todos os dias a música do Martinho da Vila sobre o filho dele, que passou no vestibular, mas a faculdade era particular!!!
Por conta do destino fui o 13° Filho desse casal de retirantes da Bahia e, junto com o meu irmão, fomos os primeiros dessa grande família a romper a barreira do Ensino Superior em nossa família!!!
Lembro-me bem do discurso apaixonado que fazias pela educação, e como professor de História que mais tarde me formei, achava que nunca tinha me decepcionado em escolher Vossa Excelência para ser meu candidato em todas as eleições que pude votar.
Porém, neste momento em que a História fala mais alto, e exige de nós uma outra postura, que é a defesa intransigente da DEMOCRACIA, o vejo do outro lado....
Aliado a figuras emblemáticas e que representam todo o retrocesso democrático, tais como, Agripino Maia, Jutahy Magalhães, Ronaldo Caiado, Alberto Fraga (que o Senhor combateu!!!) quem é morador da Ceilândia sabe o que era o 8° Batalhão da Polícia antes do Senhor ser Governador, e tantos outros que nunca se preocuparam com o pobre, com o Negro, com as Mulheres...
Me entristece te ver ao lado de figuras como Bolsonaro, Feliciano, Pauderney...Queria te ver ao lado do Leonardo Boff, Fernando Morais, Maria da Conceição Tavares e tantos outros... senti sua falta ali.... Em um breve exame de consciência tenho certeza que seus pares de hoje nunca foram os seus pares.
Gostaria realmente acreditar no meu irmão, ora mencionado neste texto, sobre a histórica palestra do saudoso Milton Santos ao seu lado na Universidade de Brasília. Com toda a certeza, ele estaria defendendo o que sempre defendeu e envergonharia com tal postura adotada por Vossa Excelência.
Fiquei muito decepcionado por te ver do lado de pessoas que jamais imaginei que pudesse estar ao lado...
            Hoje tenho dois filhos e tenho certeza que no futuro eles terão orgulho por um dia eu ter votado em você, só que mais orgulho tenho certeza que terão por ver que não foi por orgulho ou vaidades que mudei de lado... infelizmente quem mudou foi o Senhor, ou prefere Vossa Excelência?

Damião Rodrigues da Silva
Filho de nordestinos
13° Filho do Seu Chico e da Dona Zélia
Ex-engraxate e ex-vendedor de doces na rua
Professor de História
Servidor Público 


segunda-feira, 13 de abril de 2015

'Lei da terceirização é a maior derrota popular desde o golpe de 64'

Para Ruy Braga, professor da USP especializado em sociologia do trabalho, Projeto de Lei 4330 completa desmonte iniciado por FHC e sela "início do governo do PMDB"
por Wanderley Preite Sobrinho — publicado 10/04/2015 03:05, última modificação 11/04/2015 16:00
Reprodução/Facebook
Ruy Braga
Contratados com idade entre 18 e 25 anos devem ser os maiores afetados, afirma Ruy Braga
Especialista em sociologia do trabalho, Ruy Braga traça um cenário delicado para os próximos quatro anos: salários 30% mais baixos para 18 milhões de pessoas. Até 2020, a arrecadação federal despencaria, afetando o consumo e os programas de distribuição de renda. De um lado, estaria o desemprego. De outro, lucros desvinculados do aumento das vendas. Para o professor da Universidade de São Paulo (USP), a aprovação do texto base do Projeto de Lei 4330/04, que facilita a terceirização de trabalhadores, completa o desmonte dos direitos trabalhistas iniciado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na década de 90. “Será a maior derrota popular desde o golpe de 64”, avalia o professor em entrevista a CartaCapital.
Embora o projeto não seja do governo, Braga não poupa a presidenta e o PT pelo cenário político que propiciou sua aprovação. Ele cita as restrições ao Seguro Desemprego, sancionadas pelo governo no final de 2014, como o combustível usado pelo PMDB para engatar outras propostas desfavoráveis ao trabalhador, e ironiza: “Esse projeto sela o fim do governo do PT e o início do governo do PMDB. Dilma está terceirizando seu mandato”.
Leia a entrevista completa:
CartaCapital: Uma lei para regular o setor é mesmo necessária?
Ruy Braga: Não. A Súmula do TST [Tribunal Superior do Trabalho] pacificou na Justiça o consenso de que não se pode terceirizar as atividades-fim. O que acontece é que as empresas não se conformam com esse fato. Não há um problema legal. Já há regulamentação. O que existe são interesses de empresas que desejam aumentar seus lucros.
CC: Qual a diferença entre atividade-meio e atividade-fim?
RB: Uma empresa é composta por diferentes grupos de trabalhadores. Alguns cuidam do produto ou serviço vendido pela companhia, enquanto outros gravitam em torno dessa finalidade empresarial. Em uma escola, a finalidade é educar. O professor é um trabalhador-fim. Quem mexe com segurança, limpeza e informática, por exemplo, trabalha com atividades-meio.
CC: O desemprego cai ou aumenta com as terceirizações?
RB: O desemprego aumenta. Basta dizer que um trabalhador terceirizado trabalha em média três horas a mais. Isso significa que menos funcionários são necessários: deve haver redução nas contratações e prováveis demissões.
CC: Quantas pessoas devem perder a estabilidade?
RB: Hoje o mercado formal de trabalho tem 50 milhões de pessoas com carteira assinada. Dessas, 12 milhões são terceirizadas. Se o projeto for transformado em lei, esse número deve chegar a 30 milhões em quatro ou cinco anos. Estou descontando dessa conta a massa de trabalhadores no serviço público, cuja terceirização é menor, as categorias que de fato obtêm representação sindical forte, que podem minimizar os efeitos da terceirização, e os trabalhadores qualificados.
CC: Por que os trabalhadores pouco qualificados correm maior risco?
RB: O mercado de trabalho no Brasil se especializou em mão de obra semiqualificada, que paga até 1,5 salário mínimo. Quando as empresas terceirizam, elas começam por esses funcionários. Quando for permitido à companhia terceirizar todas as suas atividades, quem for pouco qualificado mudará de status profissional.
CC: Como se saíram os países que facilitaram as terceirizações?
RB: Portugal é um exemplo típico. O Banco de Portugal publicou no final de 2014 um estudo informando que, de cada dez postos criados após a flexibilização, seis eram voltados para estagiários ou trabalho precário. O resultado é um aumento exponencial de portugueses imigrando. Ao contrário do que dizem as empresas, essa medida fecha postos, diminui a remuneração, prejudica a sindicalização de trabalhadores, bloqueia o acesso a direitos trabalhistas e aumenta o número de mortes e acidentes no trabalho porque a rigidez da fiscalização também é menor por empresas subcontratadas.
CC: E não há ganhos?
RB: Há, o das empresas. Não há outro beneficiário. Elas diminuem encargos e aumentam seus lucros.
CC: A arrecadação de impostos pode ser afetada?
RB: No Brasil, o trabalhador terceirizado recebe 30% menos do que aquele diretamente contratado. Com o avanço das terceirizações, o Estado naturalmente arrecadará menos. O recolhimento de PIS, Cofins e do FGTS também vão reduzir porque as terceirizadas são reconhecidas por recolher do trabalhador mas não repassar para a União. O Estado também terá mais dificuldade em fiscalizar a quantidade de empresas que passará a subcontratar empregados. O governo sabe disso.
CC: Por que a terceirização aumenta a rotatividade de trabalhadores?
RB: As empresas contratam jovens, aproveitam a motivação inicial e aos poucos aumentam as exigências. Quando a rotina derruba a produtividade, esses funcionários são demitidos e outros são contratados. Essa prática pressiona a massa salarial porque a cada demissão alguém é contratado por um salário menor. A rotatividade vem aumentando ano após ano. Hoje, ela está em torno de 57%, mas alcança 76% no setor de serviços. O Projeto de Lei 4330 prevê a chamada "flexibilização global", um incentivo a essa rotatividade.
CC: Qual o perfil do trabalhador que deve ser terceirizado?
RB: Nos últimos 12 anos, o público que entrou no mercado de trabalho é composto por: mulheres (63%), não brancos (70%) e jovens. Houve um avanço de contratados com idade entre 18 e 25 anos. Serão esses os maiores afetados. Embora os últimos anos tenham sido um período de inclusão, a estrutura econômica e social brasileira não exige qualificações raras. O perfil dos empregos na agroindústria, comércio e indústria pesada, por exemplo, é menos qualificado e deve sofrer com a nova lei porque as empresas terceirizam menos seus trabalhadores qualificados.
CC: O consumo alavancou a economia nos últimos anos. Ele não pode ser afetado?
RB: Essa mudança é danosa para o consumo, o que inevitavelmente afetará a economia e a arrecadação. Com menos impostos é provável que o dinheiro para transferência de renda também diminua.
CC: Qual a responsabilidade do PT e do governo Dilma por essa derrota na Câmara?
RB: O governo inaugurou essa nova fase de restrição aos direitos trabalhistas. No final de 2014, o governo editou as medidas provisórias 664 e 665, que endureceram o acesso ao Seguro Desemprego, por exemplo. Evidentemente que a base governista - com PMDB e PP - iria se sentir mais à vontade em avançar sobre mais direitos. Foi então que [o presidente da Câmara] Eduardo Cunha resgatou o PL 4330 do Sandro Mabel, que nem é mais deputado.
CC: Para um partido de esquerda, essa derrota na Câmara pode ser considerada a maior que o PT já sofreu?
RB: Eu diria que, se esse projeto se tornar lei, será a maior derrota popular desde o golpe de 64 e o maior retrocesso em leis trabalhistas desde que o FGTS foi criado, em 1966. Essa é a grande derrota dos trabalhadores nos últimos anos. Ela sela o fim do governo do PT e marca o início do governo do PMDB. A Dilma está terceirizando seu mandato.
CC: A pressão do mercado era mesmo incontornável?
RB: Dilma deixou de ser neodesenvolvimentista a partir do segundo ano de seu primeiro mandato. Seu governo privatizou portos, aeroportos, intensificou a liberação de crédito para projetos duvidosos e agora está fazendo de tudo para desonerar o custo do trabalho. O governo se voltou contra interesses históricos dos trabalhadores. O que eu vejo é a intensificação de um processo e não uma mudança de rota. Se havia alguma dúvida, as pessoas agora se dão conta de que o governo está rendido ao mercado financeiro.
CC: A terceirização era um dos assuntos preferidos nos anos 90, mas não passou. Não é contraditório que isso aconteça agora?
RB: O Fernando Henrique tentou acabar com a CLT [Consolidação das Leis do Trabalho] por meio de uma reforma trabalhista que não foi totalmente aprovada. Ele conseguiu passar a reforma previdenciária do setor privado e a regulamentação de contratos por tempo determinado. O governo Lula aprovou a reforma previdenciária do setor público e agora, com anos de atraso, o segundo governo Dilma conclui a reforma iniciada por FHC.
CC: Mas a CLT não protege também o trabalhador terceirizado?
RB: A proteção da CLT é formal, mas não acontece no mundo real. Quem é terceirizado, além de receber menos, tem dificuldade em se organizar sindicalmente porque 98% dos sindicatos que representam essa classe protegem as empresas em prejuízo dos trabalhadores. Um simples dado exemplifica: segundo o Ministério Público do Trabalho, das 36 principais libertações de trabalhadores em situação análoga a de escravos em 2014, 35 eram funcionários terceirizados.
CC: A bancada patronal tem 221 parlamentares, segundo o Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar). Existe alguma relação entre o tão falado fim do financiamento privado de campanha e a aprovação desse projeto?
RB: Não há a menor dúvida. Hoje em dia é muito simples perceber o que acontece no País. Para eleger um vereador em São Paulo paga-se 4 milhões de reais. Para se eleger deputado estadual, são 10 milhões. Quem banca? Quem financia cobra seus interesses, e essa hora chegou. Enquanto o presidente da Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo], Paulo Skaf, ficou circulando no Congresso durante os últimos dois dias, dando entrevista, conversando com deputados e defendendo o projeto, sindicalistas levavam borrachada da polícia. Esse é o retrato do Congresso brasileiro hoje: conservador, feito de empresários, evangélicos radicais e bancada da bala.